8 de dezembro de 2010

Qual é a da Tropa?

Ontem assisti a continuação de Tropa de Elite, febre cinematográfica nacional e na minha humilde opinião de cinéfilo de araque, um dos melhores filmes produzido em terras verde-amarela.
O protagonista do filme, Capitão Roberto Nascimento é o mais novo herói brasileiro e faz qualquer ser que tenha o mínimo de cidadania deliciar-se ao vê-lo descer a porrada em político corrupto e dar tapa na cara de vagabundo. 
No entanto, a fictícia obra do Padilha nada mais é que um justo retrato da criminalidade no Rio de Janeiro e em diversas outras cidades canarinhas, onde a podridão e a mácula da sociedade têm início nas ambições dos que compõem a cúpula dos poderes no Brasil.
Fato é que ano passado, no Estado do Rio de Janeiro, foram apreendidos cinco toneladas de drogas, e em apenas um fim de semana de intervenção no Complexo do Alemão, foram capturados mais de sessenta toneladas de tóxicos.
A obviedade nessas notícias de que as entidades que deveriam nos proteger estão envolvidas diretamente com a criminalidade salta aos olhos.
Até parece que foi a ficção que virou realidade.
Não precisou de nenhum esforço para sair do cinema com uma sensação de impotência, visualizando que o "sistema" - tão mencionado no filme - não vai mudar tão cedo com a atual mentalidade e falta de informação e educação da massa. 
Perplexo, pensei quantos Nascimentos precisamos para parir uma sociedade sem crimes e mais segura.
Mais chocado ainda, lembrei que ao contrário do "sistema", o Cap. Nascimento é só um personagem da ficção, e pior, fez até propaganda pra TIM – que já me fudeu sem sequer me beijar.
Pois é, o último que sair apaga a luz.

10 de novembro de 2010

Rupturas

Eis que ao começar o dia, contrariando qualquer supersticioso roxo, levei meu pé esquerdo ao chão naquela sexta-feira ensolarada que anunciou logo cedo o fim-de-semana bacanudo que estava por vir.
O primeiro raio de sol atravessando a janela brilhou nos olhos simultaneamente a uma dor em meu tornozelo, arrancando do peito um gemido que a tempos não soltava. Manquei o dia inteiro e, ao acreditar no máximo estar sofrendo uma tendinite, o veredito: ligamento rompido.
Desconsolado após a surpresa e pensando nas três semanas de molho mais fisioterapia diagnosticados, contive o choro enquanto mancava a caminho do carro, sentindo que indignação e até uma pequena decepção queriam alugar provisoriamente o peito que considerei, muitas vezes, inabalável.
De nada adiantou: naquela noite, até granizo choveu.
Com algumas exceções do que realmente não nos faz bem, romper, seja lá o que for, é sempre muito chato.
Exemplificando: se a simples conexão com a internet - com suas b(u)andas cada vez mais largas - cair nesse exato momento, você que está lendo meu blog, certamente ficará decepcionado e até puto(a) da vida.
Mas quem nos dera ser desconectado da rede fosse o maior dos problemas. Pode se romper relações espirituais, materiais, amorosas, profissionais, familiares, físicas e até amistosas quando não queremos, e o desgaste em cada ruptura é sempre enorme, principalmente naquelas em que emoções estão envolvidas.
E maior o nosso tempo por aqui, mais laços são criados e, dessa forma, as rupturas - para o bem ou nosso mal (mesmo buscando acreditar que nunca são para o mal).
Exercitar o desprendimento e aceitar o que a vida nos dá pode ser uma solução para os mais sensíveis às perdas, mas essa tarefa não é fácil. Dar a devida medida a cada vínculo e sofrer à sua proporção - quando devido - é coisa de gente grande, e geralmente, daquelas um pouco mais vivenciadas que nós, aprendizes.
Ainda meio chateado, talvez exista sim algo maior que se concretizará enquanto estiver cozinhando no banho-maria do tédio, limitado e impossibilitado em realizar o que mais gosto.
Alivia imaginar que quando algo é ruim, poderia ser muito pior.
Lembrem-se disso ao terminar de ler isso aqui.

27 de outubro de 2010

À Prova de quê?

Numa segunda-feira azeda, zapeando canais a procura de um programa que se ajustasse à medida da minha preguiça, reassisti "Profissão: Perigo" a série de ação onde MacGyver, um agente secreto, sobrevivia aos mais perigosos embates e explodia o mundo usando artefatos elementares, geralmente montados com seu canivete.
Apesar do rosto de MacGiver estar eternizado na mente de quem nasceu no máximo até o ano de 1985 - creio eu, não me lembrava da simplicidade da série, sua narrativa e da naturalidade em construir um avião partindo de uma caixa de pizza ou então explodir um banheiro usando uma chave de fenda e estrume de cavalo.
Foi o deleite do Macunaima...
Outro dia, novamente xuxava ao léo o botão do controle remoto da TV a cabo quando me deparei com "À Prova de Tudo", uma série no formato reality, onde um ex-agente militar (dessa vez de verdade) sobrevive aos lugares mais inóspitos da terra usando, assim como MacGyver, a natureza e um simples canivete.
Por mais que me perder entre montanhas virgens e congelantes do Himalaia esteja fora do contexto, é curioso se imaginar na situação que o mentecapto -  provavelmente muito bem pago - se enfia e até onde o homem vai quando a fome e seu instinto de sobrevivência aperta o seu calo.
Caçar e assar um coelho, comer besouros ou até aranhas (quem me conhece sabe o que isso representa) pareceu interessante no conforto do nono andar.
Bora na filosofia: mesclando esses dois episódios, pensei o quanto somos "survivors" na cidade da garoa, passando por situações desumanas e pior, sabendo tratar-se de privilegiados.
Só que ao contrário desses caras, o bípede aqui crê que estamos complicando as "armas" para a sobrevivência, ao invés de, como os outros dois loucos supracitados, simplificá-las.
Não sei aonde tanta tecnologia aliada a cadência irracional que respiramos vai dar, mas uma coisa tenho dito e mostrado: meus mullets, assim como os do MacGiver, já estão a postos.
E tome futebol!
Ié-ié.

25 de outubro de 2010

Atazanando o Robson

Quando se aposentou, no começo dos anos noventa, meu pai voltou a advogar e montou seu escritório na Rua Marquês de Itu, região central de São Paulo, ao lado do Elevado Costa e Silva, vulgo minhocão.
Nessa época eu contabilizava uns nove anos de idade, e vez ou outra, quando dava um jeito para não ir à escola – meu primeiro carma - meu velho me arrastava para vê-lo trabalhar.
Enquanto ele realizava compenetrado a sua função, eu, solto e cheio de vigor como qualquer criança, buscava meios de me ocupar.
Mas para a sorte de todos, muito mais efetivo do que contar pulos de carneiros sobre a cerca, era ouvir o mantra tarja-preta do barulho dos automóveis passando pelo minhocão que ecoava entre os prédios, e que deixava a criança desocupada dormindo no sofá da sala de reunião por boa parte do dia.
No entanto, recuperado do sono avassalador e energizado por ter me entregue cegamente a ele, logo partia para a outra modalidade de entretenimento: atazanar o Robson.
Robson foi o primeiro estagiário do meu pai. Na minha memória era um sujeito gordo, pele clara, cabelo castanhos claros e ondulados, que usava um bigode que lhe ajudava a disfarçar algum dente torto, sempre muito feliz, boa praça, solícito e que – gosto de acreditar – me aturava voluntariamente.
Ele era bem gente-fina. Sempre parava o seu trabalho e deixava eu bater na Olivetti elétrica me fornecendo rascunhos de papéis A4 e dando idéias para que escrevesse algumas frases.
Mas para o seu azar, com o tempo, a meninice tomou posse de mim e  a Olivetti deu lugar ao elástico e o papel A4 ao clipe de metal. Logo, em qualquer vacilo do estagiário, voavam clipes no meio das suas nádegas, atividade só interrompida quando seus berros chegavam ao ouvido de meu pai. Mas ele, Robson, se importava com isso muito menos que seu patrão, e até acho que gostava da farra feita pelo moleque pilhado.
Ele era puro ao ponto de, com gosto, contar suas histórias de criança e como montava, usando bexiga e um bob de cabelos de sua mãe, um sagaz projetor de feijão. Na semana seguinte, obviamente, o clipe dava lugar ao feijão. Pobre Robson.
Quando Kurt Cobain explodiu com o Nevermind, Robson foi comigo comprar a fita-cassete daquele álbum pelas ruas e lojas do centro. Lembro da cena, juntos, andando, trocando idéias que não vou me recordar, até chegar àquele lugar de paredes tomadas de fitas e LP's. Passei a tarde escutando Nirvana no som do MP Lafer parado na garagem do escritório. Robson disse que tinha que trabalhar e não poderia escutar a fita comigo.
Noutra oportunidade, o Robson, que, apesar de sua estampa preguiçosa, dizia ser um expert em bicicletas, foi comigo a outra loja comprar protetor de câmbio para as mountain-bikes de dezoito marchas que eu e minha irmã tínhamos ganhado. Lembro dele dizendo que já havia pedalado mais de cem quilômetros num dia e eu, talvez ainda um pouco ingênuo, achei o máximo.
Depois de formado, Robson, com muito custo, passou no exame da ordem e tornou-se advogado, trabalhando num outro escritório por indicação do seu ex-patrão.
As últimas notícias que tive, foi que ele tinha se casado e, infelizmente, faleceu vítima de um infarto fulminante pouco tempo depois. Sabe-se lá por qual razão, dizem que as pessoas boas se vão antes.
Lembrei do Robson e de todas essas histórias neste último final de semana não sei por qual motivo. Mas senti que precisava escrever e dividir o pouco da lembrança que me restou dele.
É o que fica da vida.